Você é a favor ou contra a vacina obrigatória? Já escrevi sobre isso duas vezes, sob aspecto político, e faz-se necessário um terceiro, apenas olhando o jornalismo. Em tempos de desinformação, o jornalismo precisa ser mais didático com os seus leitores. Títulos e notícias preguiçosas facilitam a disseminação de fake news.
O que o Supremo Tribunal Federal julgou em dezembro, era se um ente federativo (município, estado ou união) poderia impor sanções para aqueles que recusarem a vacina contra a Covid-19. Com a aprovação, uma prefeitura poderá condicionar o acesso a espaços públicos fechados, matrículas em escolas, se o cidadão não tiver vacinado. Isso depois de estar a disposição de todos, claro.
Isso significa obrigatoriedade? Tanto faz. Reflexões sobre a palavra obrigação são desnecessárias neste momento. O que precisa ficar claro é que o STF não autorizou o Estado a enfiar uma vacina goela abaixo do povo. Ninguém vai ser preso se não tomar. Se a decisão é certa ou errada, vale um bom debate, mas primeiro tem que ficar claro que são coisas diferentes.
Alguns podem dizer-me que as duas manchetes em questão citam que são sanções, até mesmo no título, no caso do G1, e ambas trazem mais informações na linha de apoio? Mas quem disse que o cidadão entra na notícia? Mutos só leem a manchete e se quer clicam nela.
Se a palavra obrigatório passa um sentido para a frase, mas nas verdade o que o STF entende sobre obrigatoriedade é outra coisa, o termo não deveria ir para o título da notícia. Algo como “STF autoriza restrições contra quem não quiser tomar a vacina”. Sim, porque quem não quiser tomar, não tomará.
É função do jornalismo explicar que tipo de obrigatoriedade é essa que o STF entendeu. Explicar como funciona a eficácia de uma vacina, o que é preciso para uma pandemia acabar, entre outras coisas. Quem anda a fazer isso e muito bem é a BBC no Brasil, que explicou a questão da obrigatoriedade com exemplos em outras vacinas.
O Jornal Nexo também faz um excelente trabalho de jornalismo didático, como um podcast chamado Politiquês, que desmistifica questões da política. Porém, tanto BBC Brasil quanto Nexo são chegam a maior parte da população brasileira, mesmo que a BCC seja gratuita em sua versão digital em português.
Por que o jornalismo não é mais didático no Brasil? Porque isso não gera muita audiência, não gera retorno na hora, cliques, visualizações, pontos no Ibope (TV aberta).
Ao invés de esclarecer assuntos para a população, alguns setores da imprensa apostam em debates e falsas polêmicas. A própria obrigatoriedade da vacina já foi explorada pela CNN Brasil, por exemplo, no seu quadro O Grande Debate, a partir da premissa errada que o governo queria forçar todo mundo a tomar.
Os promotores dos debates sobre falsas polêmicas sempre argumentam que querem mostrar os dois lados de um mesmo assunto, opiniões contraditórias para que o público forme sua opinião. Porém, sem esclarecer o assunto, o cidadão realmente indeciso sai mais mais em dúvida ao ver um desses debates. No fim, quem dá a audiência são os militantes dos lados envolvidos.
Em 11 anos de atuação no jornalismo brasileiro, orgulho-me em ter produzido reportagens que tinham objetivo de explicar assuntos, esclarecer polêmicas desmistificar alguns clichês repetidos na sociedade como “A polícia prende, a Justiça solta“, sobre como funciona o Modelo Federativo do Brasil, ou até mesmo em um artigo opinativo sobre as funções de um vereador.
Apostar mais em reportagens didáticas e menos em falsas polêmicas parece ser um caminho óbvio para o jornalismo em tempos de desinformação. O desafio é conseguir a audiência em curto prazo, sem cair em tentações como click-baits.
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