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O jornalismo personificado nos portais de notícias

O meio é a mensagem: o famoso pensamento de Marshall McLuhan nunca fez tanto sentido quanto nos dias de hoje, onde temos um jornalismo personificado cada vez mais forte. Enquanto o ChatGPT difunde a ideia de um jornalismo não produzido por humanos, portais de notícias como UOL, NSC Total e Metrópoles apontam no sentido contrário: um jornalismo cada vez mais personificado em colunistas.

Primeiramente, a ideia de um jornalismo apegado à credibilidade individual dos seus profissionais é antiga. Eu era estudante de jornalismo em 2002 e vi um outdoor da TV Record em Itajaí que questionava: se o apresentador Graciliano Rodrigues disser que vai chover, você arrisca sair sem guarda chuva? Jornais impressos sempre usaram seus colunistas para vender jornais. Porém, o ponto em questão é um pouco diferente.

O jornalismo personificado dos portais de notícias de hoje alterou a estrutura das redações. Antes, os jornais tinham as editorias: política, economia, esportes, geral, cultura. Hoje, em casos como do Metrópoles de Brasília, os colunistas viraram mini editorias, pois eles têm equipes próprias de repórteres. Antes, os colunistas eram formadores de opinião. É claro, haviam os colunistas de bastidores, fofocas de políticas, do futebol. Hoje, não há uma definição exata do que é informação, do que é opinião.

Metrópoles

Menu do Metrópoles. Destaque total para as colunas-editorias

Este artigo começou a ser elaborado por causa do Metrópoles. Trata-se de um jornal digital com sede em Brasília, fundado pelo ex-senador Luís Estevão, com um certo foco regional. O Metrópoles apostou em colunistas famosos, com muita credibilidade para ganhar relevância nacional. Por exemplo, o jornalista Guilherme Amado, especialista em bastidores da política.

O tamanho do jornalismo personificado do Metrópoles é evidente na página expediente. As colunas de Amado, Igor Gadelha, Fábia Oliveira, são apresentadas como editoriais. Com chefe e repórteres. Não há uma editoria de política, temos as editorias dos colunistas que abordam o tema.

UOL

O UOL, junto do Terra, foram decisivos para a popularização da expressão “portais de notícias”. Eles eram provedores de internet que ofereciam na mesma página, conteúdos jornalísticos, de entretenimento e serviços digitais. Propriedade do Grupo Folha, o UOL sempre vendeu assinaturas, inicialmente ligada aos serviços de internet, depois, a uma oferta de conteúdos. Nos últimos anos, o UOL apostou pesado no jornalismo personificado: aumentou consideravelmente o número de colunistas e passou a fazer vídeos, lives, podcasts com eles.

As colunas e os vídeos com os colunistas em destaque na capa do UOL

A capa do UOL evidencia o jornalismo personificado: os colunistas têm muito destaque na página inicial e várias das manchetes são links para colunistas que não se restringem à opinião. Juliana Dal Piva, uma das grandes repórteres de política do Brasil hoje, é colunista. José Roberto de Toledo, que coordenou o Estadão Dados e o site da Piauí, é colunista.

NSC Total

Escrevi um artigo recentemente com a jornalista e pesquisadora Magali Moser sobre o fim dos três grandes jornais de Santa Catarina. No lugar ficou o portal NSC Total, que também é um adepto do jornalismo personificado.

Capa do NSC Total destaca a autoria de cada chamada

A capa do NSC Total acima comprova: o espaço dos colunistas é gigante, não apenas restrito aos antigos espaços de colunismo que havia no começo da migração dos jornais para o digital. A página de expediente afirma que o NSC Total possui 6 editores, 9 repórteres e 11 colunistas pelo Estado. A propaganda da NSC para assinaturas destaca os 11 colunistas, como o “melhor time de SC”.

O jornalismo personificado

A jornalista e pesquisadora Ana Brambilla abordou o tema no começo deste ano. Segundo a autora, a personificação é uma estratégia que ajuda na humanização na relação entre o meio de comunicação e a audiência. É uma pessoa, com rosto, opiniões próprias a levar a informação, exatamente o contrário do jornalismo com inteligência artificial.

No entanto, a pesquisadora reforça os riscos desta personalização, principalmente o risco do jornalista se tornar/querer ser maior que a notícia e os fatos. Brambilla foca seu artigo nas relações deste jornalista que virou uma espécie de influencer. Aqui, eu quero discutir a estratégia dos jornais com esta exposição dos seus profissionais.

UOL, Metrópoles e NSC Total não são os únicos a adotarem essa estratégia. Poderíamos aqui falar da Gazeta do Povo de Curitiba e dos projetos jornalísticos no YouTube, que também privilegiam jornalistas famosos que informam e formam opinião ao mesmo tempo, como os canais MyNews e ICL Notícias.

Canais independentes

Mas afinal, este jornalismo personificado é bom ou ruim? Mais importante que responder esta pergunta, devemos observar que esta tendência não foi criada pelos grandes portais. E há uma boa recepção do público para este formato. Brambilla discute a relação dos jornalistas com os influenciadores digitais, que dominam as redes sociais.

Muitos jornalistas optaram por este caminho, atuando de forma independente, com canais em redes sociais e, principalmente, no YouTube. O esporte é o melhor exemplo: jornalistas, comentaristas de futebol que ganharam fama na TV, criaram seus próprios canais e passaram a produzir um conteúdo próprio. A personificação é tanta, que os nomes desses canais são “Canal do Fulano, Canal do Siclano”. Eles já entenderam o jogo: são jornalistas e influenciadores ao mesmo tempo. E isso vem dando certo.

Portanto, se canais de jornalistas influenciadores fazem sucesso, possuem maior engajamento por esta personificação, o que alguns portais de notícias fazem é serem uma central desses jornalistas. Algo que o extinto Huffpost Brasil tentou fazer em 2013, mas à época, focado em blogs e pessoas não tão conhecidas, o que pode ter sido um dos fatores para dar errado.

Por fim, é possível que este jornalismo personificado esteja sendo positivo no sentido de valorizar os profissionais do jornalismo. Ao transformar o jornalista Guilherme Amado em editoria, em marca, o Metrópoles ficou muito mais dependente do colunista que no formato tradicional dos jornais. Por outro lado, a vida pessoal dos jornalistas ficou muito mais exposta. No passado, um excelente jornalista poderia andar pelas suas sem ser reconhecido (a menos que trabalhasse na televisão). Hoje em dia, ficou quase impossível…

Giovanni Ramos

Jornalista, consultor de comunicação, investigador de media regionais.

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