Mas a narrativa atual do cenário político não precisa ser de um filme de terror e há exemplos no mundo de tentativa de reconectar os cidadãos a política. Na Espanha, os movimentos de rua deram origem a novos partidos políticos: O Podemos (à esquerda) e o Ciudadanos (ao centro) apesar de serem antagônicos em diversos pontos sobre a política espanhola, convergem quando o assunto é a estrutura política: a horizontalidade.
Pelo menos em tese, esses novos partidos buscam colocar o cidadão no centro da política, tentando acabar com o conceito de classe política, ou melhor, estendendo a todos. Mandatos compartilhados, decisões abertas a todos os cidadãos (não apenas um pequeno grupo com direito a voto) e a tentativa de eliminar a figura dos caciques partidários estão na pauta daqueles que tentam ressignificar a política.
Um colóquio discutiu na segunda-feira (17) à tarde na Universidade da Beira Interior (UBI) em Covilhã, Portugal, as crises da democracia e a mídia. Como já dito aqui e no artigo anterior, a Europa passou por uma crise econômica e agora passa por uma migratória, abrindo espaço para movimentos extremistas eurocéticos de partidos como o AfD (Alemanha), Frente Nacional (França) e Ukip (Inglaterra). A saída da Inglaterra da União Europeia (Brexit) foi o primeiro grande resultado dessa onda.
Jornalista e professor da Universidade Lusófona, João Almeida Santos foi direto ao ponto ao falar da crise que envolve partidos tradicionais da Europa: eles não conseguem se adaptar ao mundo de hoje, um mundo onde todos estão conectados e todos têm voz: “A rede está a introduzir uma nova lógica no poder, uma lógica do poder diluído, disseminado. O cidadão deixa de ser expectador frente aos media, ao poder público, deixa de ser passivo. Muitos dos agentes protagonistas ainda não perceberam isso”.
Se os agentes protagonistas não perceberam, outros grupos estão abrindo os olhos. Na Itália, o Movimento Cinco Estrelas aposta na democracia digital, com a participação direta popular através da internet. Na Argentina, o Partido de La Red criou uma plataforma digital para participação dos eleitores e todos os parlamentares eleitos pela agremiação seguem o “DemocracyOS” na hora de votar um projeto de lei. O Partido Pirata, que está com chances de vitória na Islândia, defende o que eles chamam de “democracia liquida”, também direta, colaborativa
Voltamos ao Brasil: qual partido hoje consegue se conectar com os eleitores? Qual partido hoje consegue se livrar do caciquismo e ser mais democrático internamente? O presidente Michel Temer afirmou que o alto número de votos nulos e abstenções é um recado para a classe política: a classe entendeu? vai fazer alguma coisa? Ou vai ajustar o processo eleitoral para impedir que novos movimentos políticos tenham êxito sobre a velha política?
O cenário político para 2018 apresenta uma disputa entre Lula (PT) e Geraldo Alckmin (PSDB). Alguém acredita que dessas duas forças políticas sairá alguma renovação? O PT levou uma surra nas eleições e mostra ter dificuldades em se renovar. O PSDB saiu fortalecido esse ano, mas sabe que os votos nulos e as abstenções obtiveram sucesso maior. São votos desperdiçados esse ano, mas que podem ser direcionados a novas forças nos próximos pleitos.
O PMDB dispensa comentários. O PSB mostra estar perdido sem Eduardo Campos. A Rede surgiu como um partido para renovar a política, inclusive citou o Partido de la Red (ARG) e o Podemos (ESP) em seu primeiro horário eleitoral. Mas houve traços de caciquismo em algumas cidades nessas eleições, onde a vontade da maioria dos militantes foi derrotada pela preferência dos líderes nacionais em coligações de algumas cidades.
As eleições de 2016 não significaram apenas uma paulada no PT. Todo o sistema foi abalado com uma descrença geral no processo político. Ou surgem novos movimentos políticos, horizontais, cidadãos, decididos a reinventar a política brasileira, ou o eleitorado continuará fugindo das urnas, dando espaço para movimentos autoritários e populistas saírem vitoriosos.
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