No dia 15 de novembro, milhões de brasileiros irão às urnas para eleger prefeitos e vereadores de mais de 5 mil municípios. Devido a pandemia do coronavírus, as campanhas eleitorais devem ser ainda mais digitais, focadas em redes sociais. E para os habitantes de mais de 60% dos municípios, a fonte de informação será mesmo as redes sociais e as conversas no dia-dia, afetadas pela pandemia, pois essas cidades não possuem NENHUM MEIO DE COMUNICAÇÃO LOCAL.
As informações foram publicadas pelo Atlas da Notícia no final de 2019, ou seja, antes da pandemia do coronavírus. São 62,6% de municípios sem cobertura noticiosa, quase todos pequenas cidades no interior do Brasil, mas correspondendo a 18% da população.
A maior parte do deserto de informações está nas regiões Norte e Nordeste e nos municípios por piores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH). Florianópolis (SC) é a capital brasileira com maior quantidade de veículos por habitante: 16,6 para cada 100 mil habiantes. Mas há cidades como Canela, na Serra Gaúcha, de bom IDH, também sem nenhum jornal ou rádio.
Pandemia e o agravamento da crise
O deserto de notícias detectado no Brasil e em outros países do mundo como os Estados Unidos tem origem em vários fatores, mas destaca-se a crise financeira enfrentada pelo jornalismo em geral, mas com sérios agravantes no local.
A situação está piorando muito neste ano e ainda não há uma luz no fim do túnel. Com a pandemia, o comércio sofreu sérias restrições e entrou em crise, sobretudo o pequeno comércio local, fonte de receita de jornais locais. As prefeituras também perderam receitas e diminuíram suas publicidades nos jornais.
O resultado é catastrófico: em Santa Catarina, um dos jornais mais tradicionais do interior, o Correio Lageano, fechou as portas com a pandemia. Segundo o jornalista e pesquisador Carlos Castilho, 330 empregos de jornalismo foram extintos somente na primeira semana de maio nos Estados Unidos e a revista digital Vice reduziu sua redação no mundo inteiro, demitindo toda a equipe no Brasil.
Jornalismo comunitário pode ser uma saída?
Repensar modelos de negócios para o jornalismo local em cidades onde há deserto de notícias é um desafio porque, para muitos, desafia a lógica comercial. Como revelou o Atlas da Notícia, a maioria das cidades sem jornais são pobres, não há atividade econômica suficiente para sustentar uma empresa jornalística que vise lucro.
A saída, neste caso, pode ser a criação de modelos não lucrativos, comunitários para funcionar o jornalismo. No artigo Escaping the news desert: Nonprofit news andopen-system journalism organizations, os pesquisadores americanos Patrick Ferrucci e Kathleen Alaimo, da Universidade do Colorado, analisam o caso de um jornal no interior do estado americano que estava no “deserto de notícias”.
A cidade, de menos de 10 mil habiantes, decidiu ter o seu próprio jornal e criou o Sun, uma publicação sem fins lucrativos, criada pela comunidade, mas que contratou e paga profissionais para desenvolver um semanário impresso e diário digital.
Apostando em uma relação ainda mais próxima com a comunidade, com doações, participação em conselhos editoriais e fora da lógica de um proprietário único, a publicação conseguiu estabelecer-se no mercado, preenchendo a lacuna deixada por publicações tradicionais que fecharam.
Ferrucci e Alaimo explicam no artigo como o Sun tornou-se um membro da sociedade, possui interação direta com os outros agentes da comunidade onde o meio está inserido, sem perder o rigor editorial. Isto claro, passa por uma comunidade que deseja ter um jornal para chamar de seu, algo que nem sempre vai ocorrer nas cidades onde há o deserto de notícias.
“Se uma organização de notícias quer se tornar parte da estrutura de uma comunidade, ela não deve isolar das partes interessadas da comunidade; em vez disso, uma abordagem de sistema aberto poderia tornar todas as instituições sociais acreditam que contribuem para fortalecer a democracia e têm um lugar na esfera pública”, concluem Ferrucci e Alaimo no artigo.