Ruas vazias e uma sensação de estar sendo vigiado. O clima do primeiro confinamento era de alerta geral. Não sabíamos exatamente o que era o tal vírus, mas tínhamos medo de sair de casa. A cidade não tinha nenhum caso registrado, mas todos comportavam-se como se o vírus estivesse ao seu lado.
Refiro-me a Covilhã, Portugal, entre março e abril de 2020. Todos em casa, trancados, procurando algo para fazer na internet. Milhares de lives, uma explosão de podcasts e o zoom fazendo parte da nossa vida como se fosse algo que já estivesse conosco há anos.
Cumprimos tão bem as regras do confinamento que celebramos os primeiros dias com o comércio aberto como se estivéssemos sendo soltos após anos na prisão. Orgulhosos, dizíamos que cumprimos as regras e agora poderíamos, aos poucos, retomar a vida normal. Os casos diários da Covid-19 baixaram de 900 para 300, no mais alto valor da semana.
Janeiro de 2021…
Novo lockdown em Portugal, com mais de 10 mil casos por dia e recorde atrás de recorde de mortos. Os hospitais quase no limite, sistema de saúde em pânico no país. Em tese, deveríamos aderir ao confinamento com mais entusiasmo e preocupação que na primeira vez, certo?
A sensação que tive ao ir ao supermercado foi outra. Parecia que nem havia lockdown. As pessoas nas ruas, casais e grupos de amigos nas praças, pessoas andando sem máscara. Isso tudo com o comércio fechado. A Covid continua entre nós e agora está muito mais perto. E não temos mais a mesma determinação para confinar.
Cansamos. Como pesquisador, posso trabalhar de casa e estou reduzindo ao máximo os contatos sociais, programando e organizando as vezes que preciso sair de casa. Mas a maioria não pode ou não pensa assim. Continua sua vida normal e parece não cogitar ficar em casa.
Aplicando a Portugal o Teorema de Vampeta1, o governo finge que proíbe e as pessoas fingem que cumprem as regras. A maioria está consciente do perigo do coronavírus, mas não tem mais paciência para um lockdown.
Quase lá…
Quem não está cansado, está ansioso demais com a demora na entrega das vacinas. Apenas duas empresas foram aprovadas em Portugal no momento que este texto é publicado. Há uma terceira a ser aprovada ainda em janeiro (Oxford/Astrazeneca) e duas a caminho (Curevac/Bayer e Johnson&Johnson).
Nem refiro-me a uma vacinação em massa para a toda a população, mas completa para os grupos prioritários, suficiente para tranquilizar os hospitais e permitir a volta dos serviços, ainda com restrição.
Seja o cansaço, seja a ansiedade, estamos todos com a saúde mental afetada.
1 – “Eles fingem que pagam, eu finjo que jogo“, do ex-jogador Vampeta, sobre sua passagem pelo Flamengo.