Manteigas é um dos 55 municípios de Portugal no mapa dos desertos de notícias. Uma pequena vila com um pouco menos de 3 mil habitantes, sem nenhum meio de comunicação desde 2001, quando o único jornal fechou as portas.
Manteigas, na Serra da Estrela
Mas então, se não há nenhuma mídia, como os habitantes de informações sobre o que acontece na vila? Esses moradores dependem dos meios de cidades vizinhas ou estão a mercê do mundo caótico das redes sociais? Como o poder público se comunica com a população? Pois foram essas algumas perguntas que motivaram uma pesquisa sobre o consumo de informações em um deserto de notícias.
Como resultado dessa pesquisa, foi publicado hoje na revista Journalism and Media com o título: Sourcing Local Information in News Deserts. Além do dono desta página, assinam o artigo os pesquisadores Luísa Torre, Mateus Noronha e Pedro Jerónimo, todos vinculados ao LabCom, unidade de pesquisa em comunicação e artes da Universidade da Beira Interior.
LEIA AQUI O ARTIGO (EM INGLÊS)
Background: os desertos de notícias
Primeiramente, é preciso ressaltar que o LabCom lidera em Portugal os estudos sobre os desertos de notícias. O grupo de pesquisadores publicou o primeiro relatório oficial em 2022, com o mapeamento dos desertos no país. A partir daí, pesquisou-se temas subsequentes como este do artigo. O LabCom publicará um novo relatório provavelmente no final do ano. Aliás, quem acompanha essa página sabe que o primeiro levantamento de dados dos desertos de notícias de Portugal foi publicado AQUI em 2020.
O município de Manteigas é o objeto desta pesquisa. Por quê? Porque a vila não é apenas uma localidade sem mídia. Há um caso muito curioso envolvendo o presidente da Câmara (que no parlamentarismo é equivalente a prefeito). Em 2022, o governante atuou como blogueiro durante os incêndios na Serra da Estrela, com informações atualizadas da tragédia. Mas ele fez isso na sua rede social própria, não nos canais institucionais do Município.
Metodologia e resultados
A metodologia consistiu em três grupos focais com moradores da cidade: jovens, adultos e idosos. As perguntas para os moradores abordavam questões como fontes de informação, desinformação e fake news, confiança nas fontes e a importância de um meio da comunicação na vila.
Como resultado, o artigo revela a força das redes sociais MESMO em uma vila onde a maior parte da população é idosa. Quase todos os participantes dos três grupos focais falaram que seria importante Manteigas possuir um meio de comunicação, mas vários, principalmente entre idosos e adultos, destacaram críticas ao jornal que existia.
Por fim, o artigo abre um debate sobre a proximidade no jornalismo. Não adianta ter um jornal para garantir a mediação do debate público de uma localidade, ainda mais nos tempos de redes sociais. Reinventar o jornal não é apenas no sentido tecnológico e financeiro, é preciso rever o papel do jornalista nas comunidades, especialmente em pequenas comunidades.